Dedáleo

Pelos portais da cerca a sutileza. Se enxerga da dedálea faculdade.

Lar

Eu não digo que seja orgulho, mas eu gosto de ser brasileira. Não gostaria de ser alemã, nem americana, nem japonesa.

Essa terra tem mil e um defeitos, mas eu também tenho. Logo, estamos quites e estamos nos dando muito bem.

Ela nunca me impediu de ir conhecer outras fronteiras, nunca foi ciumenta. Eu posso voar e quando voltar ela vai estar aqui sempre me acolhendo. Nenhum outro lugar me acolhe como o meu lar.

E o meu lar é o Brasil.

Lua

Foi em Noronha que eu descobri que a Terra tem um satélite chamado Lua.

A Lua, pra quem vive nas cidades e não sabe, reflete a luz do Sol tão bem quanto um espelho ao ponto de eu duvidar que ela não tem luz própria.

Então eu fico sentada olhando pra ela e pro céu ao redor pensando como eu sou uma privilegiada por poder vê-la de um jeito que pouca gente pode. A vida nas cidades nos roubou muita coisa. Disso não tenho duvidas.

Eu ainda fico embasbaca toda lua cheia em Noronha. A claridade é tanta que eu me pego pensando que o Sol congelou na aurora ou no crepúsculo.

Observar a sombra ao luar, o mar todo prateado, nascer e o pôr da lua (instantes em que a Lua quer ser Sol e vira um disco dourado gigante) são momentos que os arranha-céus cortaram da nossa vida ao machucar o firmamento.

Pedra, Papel e Tesoura

Sabe quando a gente acha ilógico o jogo de pedra, papel e tesoura e não consegue entender o porquê de o papel vencer a pedra?

Em Fernando de Noronha eu descobri a resposta. Se você prestar atenção que o que impede uma pedra enorme de rolar penhasco abaixo é uma única raiz, você percebe quem tem a verdadeira força.

A água deforma a rocha, a raiz a limita. E no fim, descobrimos que a pretensa força da rocha é das mais fáceis de vencer.

E o jogo volta a fazer sentido.

Dor

Algumas pessoas acreditam em destino, outras não. Essas costumam achar que o futuro é controlado por quem a ele faça jus. Eu prefiro acreditar no caos, completo e imperativo. Eu não controlo meu futuro, deus muito menos.

A ideia aqui é da total falta de controle. E uma plena curiosidade sobre o que vem a seguir, pois se não há script, a vida toda é um improviso levado demasiadamente a sério.

Do Medo

Quando tudo o que mais desejas é o fim do dia, o sono (que se possível seja eterno), o descanso, a fuga – ainda que temporária – de tudo, eis que a insônia vem e diz para que fiques mais um pouco.

Olhe, olhe bem no rosto de todos os teus medos.

E o olhar é inevitável e te entorpece. Para tua surpresa, não consegues chorar. Sentes um torpor que te impede de relaxar os próprios músculos. Sentes esse olhar te tornar mais e mais cansado, mas também te sentes incapaz de fechar os olhos. Na verdade, já dói.

Sentes o medo se esgueirando, vai dos pés, passa pelas mãos e, por fim, impede que te movas. É uma pulsação estranha, está bem ali nas tuas veias. Sentes de fato algo estranho sob a pele. O torpor aumenta. Enfias o rosto no travesseiro, sente a respiração se tornar mais e mais lenta. Desejas de fato que sufoques, mas sabes que não será possível.

Ainda não chora. Estás mais irritado do que triste. Já não bastam todos os dias, todas as horas, ainda agora precisas passar por isso? Continuas imóvel, a cabeça começa a doer: finalmente aquela sensação de enrijecimento explodiu ali.

Te dás por vencido. Levantas e vais escrever. 

Nádia

Sentada na praça, olhava os transeuntes muito atentamente. Tentava imaginar as histórias de vida de cada um deles, adorava esse exercício. Às vezes esquecia que o mundo era feito de tantas histórias que ela jamais ouviria ou veria, então se punha a imaginá-las. Isso também a ajudava a esquecer suas próprias histórias, abandonar-se um pouco.

Quando percebia estava de volta a si. Qualquer história que imaginasse a levaria de volta às suas próprias. Era de certa forma inevitável, mas também o lembrete de que é impossível abandonar-se ou talvez de que não importa quão único sejamos, sempre há algo que nos assemelhe.

De repente lembrou-se de todas as pessoas que amou na vida e de alguma forma ainda amava todas. Gostava de lembrar o que as diferia, o que as assemelhava. E de lembrar o que lhe trouxeram de novo dos longínquos Mares dos Outros. Aqueles mares tão tormentosos, mas tão bonitos.

Mas sabia que pelos mares que navegasse, sempre navegaria só. Levantou e foi andando.